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Envelhecer em segurança no Alentejo: Compreender para agir

O envelhecimento é uma conquista da humanidade, consequência do desenvolvimento socioeconómico das sociedades ocidentais. No entanto, representa importantes desafios para as próprias pessoas idosas, para a família e para a sociedade.


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Envelhecer em segurança promove a qualidade de vida das pessoas idosas, bem como a sua autonomia, autoestima e independência (OMS, 2005), o que não significa que esta seja uma questão meramente individual. Envelhecer em segurança depende do envolvimento individual, familiar e social. Isto significa que todo o trabalho a ser desenvolvido pelos profissionais, das mais diversas áreas, não pode ignorar o papel desta tríade.

As pessoas idosas, os cuidadores formais e informais, os stakeholders comunitários e a própria sociedade precisam de agir em conjunto para se alcançar um envelhecimento em segurança. Esta é também uma matéria que precisa de se impor na agenda social e de saúde. Uma sociedade segura e saudável para todas as pessoas idosas precisa de acionar mecanismos que assegurem estes desígnios. Trata-se de, num mesmo movimento, salvaguardar e promover a saúde das pessoas idosas e simultaneamente diminuir os impactos individuais, familiares, comunitários e sociais que a falta de segurança gera. Incluir as questões da segurança das pessoas idosas nos programas de promoção da saúde e prevenção da doença é o primeiro passo. O segundo passo consiste em formar a população, numa dinâmica multidisciplinar, para que se obtenham os resultados pretendidos. Esta formação é crucial para que a mesma se consiga proteger e para exercer a sua cidadania plena, exigindo a criação de ambientes domésticos e exteriores protetores da saúde e da segurança que se adequem às suas capacidades e aos seus tempos.

Neste livro analisam-se dois temas centrais do envelhecimento em segurança: as quedas e a violência. O impacto e os custos que as quedas e a violência têm, não apenas para a pessoa idosa, mas também em termos familiares, comunitários, sociais, de saúde e económicos, justificam uma atenção social e de saúde, que atualmente tem sido marginal e se tem limitado a iniciativas esporádicas por parte dos decisores e stakeholders comunitários.

Seja no domicílio das pessoas idosas, nas instituições de acolhimento ou no espaço exterior de cada comunidade, são diversos os fatores potenciadores de quedas nas pessoas idosas, desde os fatores individuais relativos a doenças, à toma de medicação, a alterações do equilíbrio ou perda de massa muscular, ao tipo de calçado usado, até aos fatores do ambiente doméstico, como o tipo de piso nas diferentes divisões, a falta de iluminação adequada, a própria disposição dos objetos/mobiliário e o uso por vezes inapropriado de tapetes. Já no ambiente exterior, os fatores de risco estão presentes na maior parte das comunidades, desde o tipo de piso, ao estado de conservação dos passeios, aos obstáculos frequentes na via pública ou ao próprio tempo de mudança dos semáforos. Estes são alguns dos exemplos de situações do quotidiano que não promovem um envelhecimento em segurança na comunidade.

A violência sobre as pessoas idosas revela frequentemente os traços de uma sociedade onde a intolerância às incapacidades, debilidades e estados cognitivos das pessoas idosas não são toleradas e emergem muitas vezes como fatores potenciadores de situações de violência sobre estas mesmas pessoas. Socialmente, os diferentes tipos de violência sobre as pessoas idosas são, na maioria das vezes, justificados como inerentes ao próprio processo de envelhecimento, seja através de violência verbal, violência física ou violência financeira. A perda de capacidades motoras, auditivas, visuais ou cognitivas ou ainda a vulnerabilidade, que muitas apresentam, são as razões legitimadoras de atos de violência a que são sujeitas muitas pessoas idosas e que frequentemente não parecem incomodar a sociedade. Comparativamente à violência exercida sobre as crianças, diríamos a que a violência sobre as pessoas idosas desperta menos reações negativas ou é mais tolerada. Este posicionamento parece estar ancorado nas diversas campanhas, que ao longo dos anos têm lutado contra a violência infantil e que consolidaram um verdadeiro estado de alerta face a qualquer manifestação deste tipo de violência, traduzindo-se regularmente numa forte censura social, ou na atuação judicial. O mesmo não acontece com a violência sobre as pessoas idosas em que as representações coletivas da violência continuam a congregar mitos, crenças e estereótipos dessa mesma violência.

A necessidade de atuação e de conjugação de esforços, a nível comunitário e social, que promovam o envelhecimento em segurança afigura-se essencial.

As quedas nas pessoas idosas têm um impacto imediato no seu dia-a-dia e deixam sequelas, seja pela lesão local imediata, seja pelas repercussões na independência e funcionalidade, seja ainda pelas implicações sociais e económicas. Diversos estudos têm reportado um aumento das taxas de morbilidade e de mortalidade imediata ou mediata à queda, salientando igualmente que os impactos da ocorrência de quedas são elevados, embora estejam atualmente subestimados, e possam ser prevenidos. Embora, continuem a ser difíceis de enunciar as reais repercussões das quedas, porque muitos dos episódios de queda não são reportados, os custos de saúde, da dependência e da institucionalização, exigem recursos acrescidos que têm reflexos individuais, na família e na comunidade. O cálculo dos custos associados às quedas inclui os custos com a assistência de emergência, o internamento, a reabilitação, as unidades de convalescença, o apoio domiciliário, os tratamentos e as diferentes adaptações no domicílio que maioritariamente são necessárias.

Face a esta realidade, tem sido ressaltada a importância de serem desenvolvidos programas de prevenção que envolvem as pessoas idosas e a sociedade em geral. Este processo exige a formação/preparação, das pessoas idosas, das famílias, dos cuidadores informais e formais e dos stakeholders comunitários, relativamente aos fatores que estão na origem das quedas, desde os individuais aos fatores ambientais, dentro da habitação e na comunidade. Esta formação requer o envolvimento de equipas multiprofissionais dos mais variados setores, contemplando a área da saúde e segurança, a psicologia e reabilitação psicomotora, ou mesmo até a arquitetura ou urbanismo, para a criação de ambientes individuais, familiares e comunitários promotores da segurança e para a deteção e prevenção de situações de risco.

Embora o reconhecimento público da violência sobre as pessoas idosas como um problema de saúde e social seja recente, este não é um fenómeno novo na sociedade. A violência sobre as pessoas idosas tem sido definida como resultando de atos intencionais, isolados ou repetidos ou a falta de atos que causam dano ou angústia, ou atos que criam sério risco de resultar em dano a pessoas idosas vulneráveis, em relacionamentos onde existe, ou que pressupõem, uma relação de confiança com a pessoa idosa – cuidadores formais ou informais, familiares, vizinhos ou amigos (Pérez-Rojo et al, 2009). Tal como as quedas, também a violência surge associada a uma maior morbilidade e mortalidade nestas pessoas e concorrem para o seu aumento fatores como a vulnerabilidade, a fragilidade, o isolamento, o empobrecimento e a dependência financeira. Também nesta problemática urge formar a sociedade em geral e todos os que lidam quotidianamente com as pessoas idosas por forma a convergir para a tolerância zero, no que concerne à violência sobre estas pessoas.

Este livro surge na sequência do projeto Envelhecer com Segurança no Alentejo (Prevenir as Quedas e a Violência sobre Idosos) – Compreender para Agir. Refª: ALT20-03-0145-FEDER-000007, financiado pelo Alentejo 2020, Portugal 2020 e União europeia, sendo nele apresentado um conjunto de estudos e reflexões sobre a violência e as quedas nas pessoas idosas, sendo ainda lançadas algumas diretrizes sobre como agir no sentido de prevenir estes fenómenos.

Na Parte I apresentam-se diversos textos onde se analisam e discutem diferentes questões da violência exercida sobre as pessoas idosas. No primeiro capítulo intitulado Violência, abuso e maus tratos sobre pessoas idosas: algumas questões concetuais, o foco central de abordagem é a diversidade concetual presente na literatura para expressar a violência sobre as pessoas idosas, nomeadamente as definições de violência, abuso e maus-tratos, e as dificuldades que essa proliferação concetual pode gerar na análise deste fenómeno.

O segundo capítulo é dedicado ao estudo das representações sociais da violência na perspetiva das próprias pessoas idosas, mais propriamente os motivos dessa mesma violência e intitula-se Os motivos da violência sobre pessoas idosas: as representações sociais das pessoas idosas autónomas versus institucionalizadas.

No terceiro capítulo continuam a analisar-se as representações sociais da violência sobre as pessoas idosas, neste caso apresentando os resultados de um estudo comparativo entre pessoas idosas portuguesas e brasileiras intitulado Representações sociais sobre a violência: perspetiva de cuidadores de pessoas idosas no Brasil e em Portugal.

A análise das relações entre o Burnout dos cuidadores formais e o risco de violência sobre as pessoas idosas em instituições de acolhimento são apresentadas no quarto capítulo. A complexidade e exigências associadas à prestação de cuidados formais a pessoas idosas, o bem-estar físico e mental dos cuidadores e o risco de violência sobre as pessoas idosas que se encontram em instituições de acolhimento, são o tema central debatido.

Encerra-se a primeira parte deste livro dedicada à violência sobre pessoas idosas, com a apresentação de resultados acerca da relação entre a toma de determinados fármacos e o risco de violência a que a pessoa idosa pode estar sujeita, no capítulo intitulado Medicamentos e risco de violência em pessoas idosas.

Na Parte II do livro o tema central são as quedas, os seus impactos na saúde e segurança das pessoas idosas, assim como um conjunto de metodologias e programas preventivos. Inicia-se com o capítulo intitulado Um olhar psicomotor sobre o envelhecimento, onde é analisada a importância, no processo de envelhecimento, do corpo-função e do corpo-relação, e da relação dialética entre ambos.

O capítulo seguinte centra-se na análise da atividade física como uma das mais eficazes estratégias para alcançar os objetivos do envelhecimento ativo e intitula-se Envelhecimento ativo: importância da atividade física e do exercício físico na prevenção de quedas. Salienta-se o papel dos stakeholders comunitários na elaboração e implementação de programas consistentes que encorajem as pessoas idosas a participar, propiciando-lhes um envelhecimento ativo mediante a prática de exercício físico.

Segue-se o capítulo intitulado Instrumentos de avaliação do risco de quedas em pessoas idosas residentes na comunidade onde são expostos e discutidos alguns dos instrumentos de avaliação do risco de quedas em pessoas idosas mais referenciados na literatura, agrupados em função do tipo de fator de risco: neste capítulo salienta-se a importância da avaliação multifatorial do risco de quedas nas pessoas idosas com histórico de quedas, ou dificuldades na marcha/equilíbrio.

No capítulo seguinte abordam-se os impactos da institucionalização das pessoas idosas, nomeadamente o aumento do risco de queda, que se associa a fatores de ordem biológica, comportamental, socioeconómica ou ambiental, que necessitam ser regularmente avaliados. A avaliação do risco de quedas em pessoas idosas institucionalizadas é o tema central deste capítulo.

A relevância do exercício multimodal no processo de envelhecimento, direcionado para o desenvolvimento de competências físico-motoras e cognitivas e para a promoção da saúde e bem-estar das pessoas idosas é o tema central do capítulo seguinte que se intitula Exercício multimodal: uma estratégia de intervenção no envelhecimento.

O capítulo seguinte debruça-se sobre as quedas enquanto eventos associados a situações de dependência, morbilidade, ou mortalidade em pessoas idosas. Testar a suscetibilidade individual ao risco de queda e implementar programas de intervenção são uma prioridade para as pessoas idosas. Neste capítulo são apresentados alguns dos Programas de intervenção para a prevenção de quedas em pessoas idosas residentes na comunidade.

Segue-se o capítulo sobre O toque na intervenção psicomotora com pessoas idosas onde se destaca a importância do toque ao nível das relações interpessoais, da saúde e do bem-estar emocional das pessoas idosas, quer das pesoas que vivem em instituições, quer das que vivem nas suas residências e onde se apresentam os três tipos de toque frequentemente usados na intervenção psicomotora: o toque-massagem psicomotora, o toque-relaxação, e o toque-envelopamento.

Segue-se o capítulo onde são enunciados atributos e contributos da Dança como uma prática pertinente para combater o declínio físico e mental intrínseco ao processo de envelhecimento, para promover a estimulação físico-motora e cognitiva e para potenciar as interações sociais e emocionais. A dança: uma prática para a pessoa idosa é o título deste capítulo.

Para finalizar este livro apresenta-se, no capítulo intitulado A inovação tecnológica e o envelhecimento, uma importante reflexão sobre o espaço que tem vindo a ser ganho em todas as áreas da nossa vida, pela inovação tecnológica e pelas possibilidades que esta oferece, nomeadamente quando aplicada à área dos cuidados de saúde, questionando-se simultaneamente se as promessas que gera não se poderão traduzir em expetativas inatingíveis. Discute-se ainda se as inovações tecnológicas que entram no mercado, respondem a uma estratégia organizacional ou de modelos de cuidados previamente definidas, contribuindo assim para onerar ainda mais os cuidados e para gerar ou agravar as iniquidades, nomeadamente nas pessoas idosas.